Benvindos!


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Neste blogue iremos encontrar (ou reencontrar) pedaços da imaginação e criatividade humana nas mais diversas formas e feitios - Livros, Banda desenhada, Cinema, TV, Jogos, ou qualquer outro formato.

Viajaremos no tempo, caçaremos vampiros e lobisomens, enfrentaremos marcianos, viajaremos até à lua, conheceremos super-heróis e muito mais.

AVISO IMPORTANTE: pode conter spoilers e, em ocasiões especiais, nozes.


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Redneck Rampage

Os heróis, Leonard e Bubba
Em meados dos anos 90, na sequência do que se passara com Wolfenstein 3D e com o Doom, o Duke Nukem 3D originou uma série de jogos baseados na mesma mecânica de FPS.

Esses jogos, designados na gíria "Duke-likes" ou "Duke Nukem 3D-likes" usavam o motor gráfico Build (que já era um bocadinho mais 3D que o Doom) ou adaptações; neste grupo há um punhado de títulos mais sonantes:
- Blood;
- Shadow Warrior;
- Redneck Rampage.

É no último jogo, criado pela Xatrix e publicado pela Interplay, que me vou focar aqui.

Em Redneck Rampage (ou "RR", para simplificar) a história é, como era tradicional nestes jogos, mais um pretexto do que outra coisa, mas não deixa de ter piada: dois Rednecks, Leonard e Bubba, vêm-se a braços com uma invasão alienígena na qual os ETs lhes roubam o porco premiado e clonam em massa alguns personagens da sua terra, o vilarejo de Hickston.

Bubba - bronco e pouco higiénico.

 
Assim, andamos, na pele de Leonard, aos tiros por um monte de cenários devidamente labregos... e a enfrentar os clones dum velhote conhecido apenas como "Old Coot", que não hesita em atacar todos os indivíduos que invadem a sua propriedade - e que considera toda a Hickston e arredores como sua propriedade - ou o Billy Rae, que nos ataca de caçadeira em punho balbuciando monossílabos.
À medida que vamos avançando encontramos os escatológicos "Turd Monkeys" - uma espécie de macacos feitos de matéria fecal que nos atiram... bem, não é preciso dizer o quê, e que guincham algo semelhante a "turdee", aparecendo ainda outros tipos de alienígenas, tais como as Space Vixens, e a fauna local - porcos, vacas e mosquitos.

Billy Rae e Old Coot - uma praga...
...embora não tão irritantes como os Turd Monkeys!

A jogabilidade é semelhante à de outros títulos análogos - anda-se aos tiros (bem, duh!), resolve-se alguns puzzles (normalmente baseados em interruptores, embora num ou noutro tenha de se atacar um porco e usá-lo como plataforma para saltar por cima de determinados objectos), encontra-se chaves e passa-se ao nível seguinte.
Curiosamente, boa parte dos níveis tem como objectivo encontrar o Bubba, de quem nos separamos invariavelmente entre níveis. E quando o encontramos, tem que se lhe dar com o pé-de-cabra (a melee weapon da praxe) para passar de nível. Sempre é algo ligeiramente diferente do costumeiro interruptor ou atravessar uma linha pré-definida na saída do mapa. Aliás, a primeira vez que joguei RR (creio que até era uma demo) desconhecia esta particularidade e matei o desgraçado, ficando bloqueado. Sim, devia ter achado suspeito estar aos tiros a um tipo que não reagia, mas, ei, as vacas também não contra atacavam (já os porcos eram outra história).

As Space Vixens dão um toque ligeiramente SM ao jogo.
 
O arsenal é adequado ao ambiente: além do já referido pé-de-cabra, há o revólver, a caçadeira (não seria um jogo redneck sem uma), o rifle de caça, e depois entramos no domínio mais exótico - cartuchos de dinamite ("dyn-o-mite!"), uma besta que dispara dinamite, um lançador de serras circulares, caixotes de pólvora e armas alienígenas. Estas últimas são, em concreto, o canhão de braço dos Enforcers (sim, com o braço ainda agarrado) e os soutiens das Space Vixens (também conhecidos como "Alien teat gun". Sim, soutiens. E sim, disparam mesmo. Um must!

Um Enforcer. Difícil de matar mas o canhão dava um certo jeito.

 
Space Vixens e galinhas. Uma mistura estranha. Ou talvez não.

Como se depreende do que escrevi atrás, o ponto alto do RR é mesmo o ambiente. Além dos inimigos labregos, das armas saloias e da abundância de animais de quinta, temos os níveis carregados de clichés rurais do interior americano: quintas, parques de caravanas, fábricas de processamento de galinhas, a própria baixa de Hickston, bowling alleys, drive-ins, tudo complementado com comida redneck e retratos de malta que resulta de gerações de casamentos consanguíneos... Tudo conduzindo ao confronto final num disco voador gigante (e pensando nisso, raptos alienígenas não deixam de ter uma forte associação à cultura do midwest).

O Xerife Hobbes, que aparece inicialmente na baixa de Hickston

Ah, e a banda sonora psychobilly é qualquer coisa de fenomenal, aparece tocada num "8-track player", embora por vezes abafe um bocado os restos dos sons (não permitindo ouvir devidamente as one-liners do Leonard & cia.).

O jogo teve duas sequelas oficiais.

A primeira, bem, não é mesmo sequela, tratando-se sim dum level pack que não ficava a dever ao material de origem, o Sucking Grits on Route 66, que aborda as aventuras do Leonard e Bubba ao longo da mítica estrada. Tem níveis bastante originais, tais como um freak show, o museu alienígena e a convenção do Bigfoot. Ah, e dois níveis aldrabados, em que se passa de nível só por se caminhar em frente uns passos. Felizmente, os restantes mais que compensam.

A segunda, Redneck Rampage Rides Again, é a verdadeira sequela, começando com a queda do disco voador (onde termina o jogo original) na Area 69, onde aparentemente o governo dos EUA está a coleccionar artefactos e equipamento relacionado com a invasão original (clones também). Este jogo mantém os inimigos originais e acrescenta alguns novos - clones dum motoqueiro, duma chefe de claque (Daisy Mae), Jackalopes (até tem um nível que é a Jack'o'lope farm), bem como um Old Coot renovado ("groovy" diz ele, depois de uma ida a Las Vegas). Um detalhe divertido - o Old Coot e o Billy Rae são vistos várias vezes a tocar banjo e a pedir boleia para Hickston. Creio que são os originais que estavam presos na nave a tentar voltar para casa. Depois de passar por diversos cenários, que incluem pântanos, um bordel e até a casa de um personagem suspeitamente parecido com o Elvis (a casa é a Disgraceland), lá chegamos a Hickston, onde somos recebidos pelo maior Jackalope de sempre, o boss final.
O Rides Again ainda acrescenta uma arma nova (besta que dispara galinhas explosivas) e dá a hipótese de conduzir motas e barcos (nos pântanos).

As irritantes Daisy Maes, uma das novidades de Rides Again

Um super Jackalope. Em ambiente Redneck como peixe em água. 

Esta é, assim, uma série que prima especialmente pelo humor; à laia de conclusão ficam as minhas one-liners preferidas:

Leonard: "You screw with the bull, you get the horn"
Leonard (depois de fazer explodir coisas): "Hehehe, that blow them real good!"
Old coot: "Get off mah land!"
Leonard (ao peidar-se): "Swamp gas, my ass!"
Space Vixen (a morrer): "But... I love you..."
Leonard: "Screw you and the horse you rode in!"
Xerife Hobbes: "Ah am the Law!"
Old coot: "I'm gonna getcha, boy, I'm gonna getcha!"
Billy Rae: "Ye-heheah!"
Leonard: "Hold on to yer butt!"
Bubba: "Hey, Ah'm over here!"
Leonard: "Bet the place is crawling with them shit monkeys"
Daisy Mae: "You like this, boy?"
Leonard: "Turn around, boy, lemme see if I recognize you from prison"
Leonard: "Yo' ass is grass and I'm the lawnmower!"
Daisy Mae: "Go team!"
Leonard: "Hot damn!!"
Daisy Mae: "Were you raised in a barn?"
Leonard: "Busier than a one legged man in an ass kickin' contest!"
Leonard: "Jesus palamino!"

 
Depois de tanto dar (e levar) tiro nestes dois, é estranho
vê-los para aí, pacíficos, de banjo e guitarra...
 

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Mystery Men - Os Homens Misteriosos

Um dos posters do filme
 


Captain Amazing. Herói
ou peão corporativista?

Champion City é uma cidade com o crime sob controlo. O responsável por isso? O maior herói da cidade, Captain Amazing (Capitão Maravilha), que deu cabo de todos os grandes vilões: estão presos, internados, mortos ou desaparecidos.
 
Ficaram  apenas bandidos de segunda, que mal dão para ocupar o grande herói, que os neutraliza em questão de minutos sempre que tentam mostrar as suas fuças malfazejas.

Ou seja, já não tem desafios.

 
 
Bem, já no que toca aos três wannabes The Shoveler, The Blue Raja e Mr. Furious... a coisa muda de figura.
Estes três super-heróis aspirantes não conseguem impedir sequer um assalto, não obstante os seus fabulosos talentos:

- o Shoveler (Pázada) maneja a sua pá como mais ninguém consegue, um talento que procura usar sempre para benefício da sociedade;
 
O Shoveler, pronto para a acção.
- o Blue Raja (Rajá Azul), com o seu fato multicolorido espampanante e que não tem um bocadinho de azul, falando com o seu sotaque britânico simulado, é o mestre da prataria e arremessa colheres e garfos - nunca facas, pois como ele mesmo diz, não é nenhum faquir;

O Blue Raja e as suas signature weapons

 
- o Mr. Furious (Senhor Furioso), bem, enfurece-se.

Mr. Furious. Está tudo dito.
 
 
O trio de amigos tenta combater o crime, embora de modo geral, acabe por levar porrada da grossa e por ir carpir mágoas para o diner local, onde são acossados por um quarto elemento - o Spleen (Cheirete), que como resultado de ter sido amaldiçoado por uma cigana, tem um ar doentio e é uma arma química com duas pernas, com as suas flatulências activadas pelo tradicional "pull my finger".
 
Casanova Frankenstein. Sociopata,
mas com classe.
 
Entretanto, como tem de mostrar resultados perante os seus patrocinadores, Captain Amazing usa o seu nome e a influência da sua identidade civil (o bilionário Lance Hunt) para conseguir soltar do asilo para insanos o seu némesis Casanova Frankenstein (não, não tem nada a ver com o mulherengo nem com o cientista da história de Shelley), que é o último dos grandes vilões.
 
Infelizmente, nem tudo corre como o herói contava, e ele acaba preso na mansão de Casanova, o qual pretende matá-lo e destruir a cidade com um raio psychofrakulator (acho que é assim que se escreve!) que tem o efeito de fazer rebentar as cabeças das pessoas atingidas.


Duas gerações de Bowlers.
Cabe então aos wannabes salvar o Amazing. Vão começar a recrutar pessoas para o grupo, o que não corre muito bem - aparecem milhentos candidatos, mas... entre a PMS Avenger, o Pencilhead + Son of Pencilhead, entre outros cromos que tais, parece não haver muita esperança. Acabam por se lhes juntar, no entanto, o Invisible Boy (Rapaz Invisível), que fica invisível desde que ninguém esteja a olhar para ele e a Bowler (Boladora), filha do Carmine The Bowler, um antigo herói assassinado, e que tem com ela uma bola de bowling assombrada que contém o crânio do pai.

Doc Heller a trabalhar no arsenal.
 
Apoiados pelo Doc Heller, fabricante de armas não letais como o Furacão Enlatado e o Encolhedor de Roupa e treinados pelo Sphinx (Esfinge), um indivíduo que além de desmontar armas com a mente é Terrivelmente Misterioso (ser apenas misterioso não lhe basta), vão lançar-se na sua demanda. Que corre um bocado mal, já que acabam por matar acidentalmente o Amazing durante a missão de salvamento.
 
Por fim, acabam por assumir o manto de verdadeiros heróis e derrotar Casanova e os seus múltiplos associados... ficando ainda a querelar sobre o nome do grupo, quando a imprensa os entrevista.

O grupo preparado para a investida final. Da esquerda para a direita: Bowler, Invisible
Boy, Sphinx, Shoveler, Spleen, Mister Furious e Blue Raja
 
 
Este filme, lançado em 1999 e muito vagamente baseado na série de BD "Flaming Carrot", levou um bocado de porrada da crítica, o que acho francamente injusto.
Foi acusado, na generalidade, de ser um filme de super-heróis fraquinho.
 
Na realidade, é um filme de super-heróis que não se leva demasiado a sério - é uma paródia mas também uma homenagem ao género. Mas essencialmente uma paródia.
 
Tem uma série de conceitos divertidos - a começar pelos heróis em si (alguns dos quais pescados da tal BD), sendo o meu favorito o Blue Raja. Há que admirar um tipo que dispara colheres e garfos e pretende combater o crime dessa maneira; também acho impagável o Invisible Boy, principalmente porque ele ficava mesmo invisível desde que ninguém o estivesse a fitar (o que se torna um elemento essencial na história lá para a frente no filme).
Os vilões temáticos também são engraçados - a gangue da Disco, os frat boys, por aí fora.

Os líderes dos Disco Boys, Tony P e Tony C. Sim, o da esquerda é o Eddie Izzard.
 
 
Os diálogos têm os seus altos e baixos, é verdade.
As tiradas pseudofilosóficas do Sphinx por vezes são um bocado chochas, mas algumas estão muito bem conseguidas, como "Numa luta tens que usar todos os teus membros, tal como o polvo que toca bateria" ou "Somos o número um! Todos os outros são número dois, ou então números abaixo".
Para compensar os trocadilhos fáceis do Blue Raja com a palavra "Fork", temos bocas como "Vão por ali, vamos triangular a posição" a quem alguém coloca a questão "Equilátero ou isósceles?".
E a minha troca favorita de todas:
Mr. Furious: "Isso é porque o Lance Hunt é o Captain Amazing!"
Shoveler: "Lá estás tu. Não comeces com isso outra vez. O Lance Hunt usa óculos, o Captain Amazing não usa óculos."
Mr. Furious: "Ele tira-os quando se transforma."
Shoveler: "Isso não faz sentido nenhum. Assim ficava sem ver nada!"
 
Visualmente, o filme está bem conseguido sem ser nada de transcendente, com efeitos visuais eficientes que se aguentam bem 15 anos depois; numa nota pessoal, não consigo deixar de olhar para a Champion City e lembrar-me da Gotham City do Tim Burton.
 
E um aspecto em que acho que a produção também se esforçou e que passou ao lado... os heróis rejeitam armas de fogo e outras armas potencialmente letais, o que é um toque simpático.
 
Se decidirem ver ou rever este filme (partindo do princípio que este spoiler gigantesco não o arruinou), tentem ter em conta que NÃO é um filme sério.
 
É, isso sim, uma maneira divertida de passar um par de horas.

Um dos diálogos que espelha perfeitamente o humor do filme.